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Pesquisas desenvolvidas no Brasil e nos EUA podem dar origem a novos tratamentos para a obesidade e o diabetes

Cientistas do Brasil e dos Estados Unidos criaram em laboratório camundongos geneticamente modificados que despertariam inveja em muita gente: eles podem comer à vontade sem engordar ou se tornar diabéticos. A façanha foi realizada de forma independente pelos dois grupos por meio de métodos similares que interferiram na atividade ou na produção de duas proteínas diferentes, ambas associadas à obesidade e ao diabetes. Os resultados podem no futuro revolucionar o tratamento dessas doenças.

A obesidade é caracterizada por um estado crônico de inflamação de baixo grau no organismo. Esse processo está associado ao aumento de citocinas pró-inflamatórias, proteínas do sistema imunológico que, em algumas situações, são secretadas também pelo tecido adiposo. A ingestão de alimentos muito calóricos aumenta a quantidade dessas citocinas no organismo, o que gera a inflamação.

Pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) focaram seu estudo em uma das muitas citocinas existentes, o chamado fator de necrose tumoral alpha (TNF-a). O TNF-a é um dos principais fatores inflamatórios envolvidos na obesidade e contribui também para a resistência à insulina e à leptina, hormônios que desempenham papel importante na captação da glicose do plasma sanguíneo e na queima de gordura, respectivamente. Se o TNF-a está aumentado no organismo, o que acontece em indivíduos obesos, o corpo fica resistente a esses hormônios, torna-se mais suscetível ao diabetes e tem dificuldade para queimar gordura.

Os camundongos modificados queimaram mais calorias que os normais

A equipe inibiu o gene do receptor de TNF-a nos camundongos e observou que os animais, mesmo comendo alimentos hipercalóricos, ficaram protegidos de desenvolver obesidade e diabetes. Os camundongos modificados apresentaram maior produção de calor em relação aos animais normais. Isso se refletiu no aumento do consumo de oxigênio e da queima de calorias.

Terapia promissora
“O TNF-a faz parte do desencadeamento tanto da obesidade quanto do diabetes”, diz a bióloga Talita Romanatto, uma das autoras da pesquisa, realizada no Laboratório de Sinalização Celular da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. “Se for possível criar medicamentos que controlem a função dessa citocina, poderemos avançar no tratamento dessas doenças”, completa a pesquisadora.

Quando submetidos a uma dieta hipercalórica, os camundongos modificados (à direita) não engordaram, enquanto os normais (à esquerda) tornaram-se obesos (foto: Talita Romanatto).Romanatto ressalta que a técnica para inibir o receptor de TNF-a ainda não pode ser testada em humanos. “A pesquisa é muito recente e necessita de vários outros testes”, esclarece. A pesquisadora acrescenta que o TNF-a é uma proteína do sistema imunológico e sua ausência gera graves problemas de infecção. Os camundongos modificados no estudo apresentaram deficiência imunológica.

“Se inibirmos totalmente o receptor de TNF-a de uma pessoa, com certeza ela vai ter problemas imunológicos”, diz Romanatto. “Nossa pesquisa mostrou um caminho para reverter o quadro de obesidade.” Segundo a bióloga, outros aspectos metabólicos dos camundongos precisam ser avaliados para que a inibição do receptor de TNF-a possa ser usada como tratamento. O estudo brasileiro foi publicado no The Journal of Biological Chemistry.

Gene desativado
No estudo norte-americano, conduzido por cientistas da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, os camundongos foram modificados por meio da inativação do gene responsável pela produção de outra citocina pró-inflamatória, a IKK-e. Os resultados, publicados na revista Cell, foram semelhantes aos da equipe brasileira: os animais modificados não engordavam ou desenvolviam diabetes quando submetidos a uma dieta hipercalórica, com a vantagem de que a técnica norte-americana não provocou imunodeficiência.

A técnica norte-americana não provocou imunodeficiência nos animais“Já estudamos outros genes associados à obesidade, os chamados ‘obesogenes’, mas este é o primeiro que encontramos que, quando deletado, impede o ganho de peso do animal sem efeitos indesejáveis”, conta à CH On-line um dos pesquisadores responsáveis pela pesquisa, o bioquímico Alan R. Saltiel.

Como a inativação de genes em humanos ainda não é possível, o desafio atual é descobrir outro modo de inibir a produção de IKK-e. “Não é muito difícil encontrar inibidores de citocinas”, avalia o pesquisador. E pondera: “Um dia talvez seja possível desativar genes em humanos, mas teríamos que mirar em um lugar muito específico.”

A equipe norte-americana já está à procura de um inibidor para a IKK-e. Saltiel acredita que a descoberta revolucionará o tratamento da obesidade: “Estamos muito perto de descobrir um inibidor para essa citocina. Se conseguirmos, novos tratamentos para obesidade e diabetes estarão consolidados em uma década.”

Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line

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